Perda de Tati Machado expõe realidade de 44 mil mães que perdem bebê na gestação ou após nascimento

Tati Machado, apresentadora da TV Globo, anunciou na última semana que perdeu o bebê na fase final da gravidez. Todos os anos, mais de 44 mil mães no Brasil têm seus sonhos de viver a maternidade interrompidos durante a gestação, como aconteceu com Tati, ou no primeiro mês de vida do bebê. Elas precisam aprender a lidar com o luto, frequentemente sem o suporte da sociedade e dos profissionais de saúde.
Damiana Angrimani, uma das coordenadoras do Instituto do Luto Parental (ILP), relata que, com quase dez semanas de gravidez, foi informada pela médica de que seu bebê não apresentava batimentos cardíacos. Ela foi levada para uma sala de espera no laboratório de medicina fetal, lotada de futuras mães, onde recebeu o relatório de uma enfermeira que lhe desejou “parabéns”.
“Acho que o protocolo na entrega do papel inclui dizer parabéns para todos. Eu lembro que aquilo me bateu tão mal. Meu marido ficou muito irritado. E depois disso foi uma sucessão de atendimentos ruins. E o final deles foi a minha terapeuta da época dizer: ‘Eu não entendo por que você chora tanto. Era só um combinado genético, não era um bebê’”.
Damiana e Tati estão entre as milhares de mães que, a cada ano, sofrem com a notícia de um óbito fetal (até 20 semanas de gestação), perda gestacional (após 20 semanas de gestação) ou óbito neonatal (quando o recém-nascido morre até o 28° dia de vida).
Mas a sociedade pode tornar esta dor menos invisível. No início de abril, o plenário do Senado aprovou um projeto de lei que assegura direitos para mulheres e familiares que enfrentam perda de bebê recém-nascido ou perda gestacional espontânea.
O texto aprovado – relatado pela senadora Augusta Brito (PT-CE) – foi uma junção do projeto da deputada Geovânia de Sá (PSDB-SC) com o texto construído pelo então deputado federal Alexandre Padilha em 2019 (hoje ministro da Saúde), em parceria com instituições que atuam pela causa. O PL segue agora para a sanção presidencial.
Mesmo sendo uma dor profunda, o luto pela perda de um bebê ainda é pouco reconhecido socialmente. Muitas vezes, amigos e familiares, na tentativa de consolar, acabam invalidando os sentimentos dos pais com frases como “logo você engravida de novo” ou “foi melhor assim”. Esse tipo de comentário pode reforçar a dor e a sensação de solidão.
Especialistas explicam que o luto gestacional ou neonatal é legítimo e precisa ser acolhido como qualquer outro tipo de perda. Não importa se o bebê tinha poucas semanas ou se chegou a nascer para os pais, a dor é real e o vínculo já existia.
O apoio emocional de amigos, familiares e, se possível, acompanhamento psicológico, é essencial nesse processo. Uma escuta empática, sem julgamentos ou tentativas de minimizar a dor, faz toda a diferença. É importante permitir que os pais falem sobre o bebê, se quiserem, e vivam o luto no seu tempo.
A legislação brasileira assegura alguns direitos às mães em casos de perda gestacional. Desde 2020, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê licença-maternidade em situações de parto a partir da 23ª semana de gestação, mesmo se o bebê nascer sem vida. Em casos anteriores, não há previsão de licença, mas é possível solicitar afastamento médico com auxílio do INSS.
Algumas famílias encontram conforto em rituais de despedida ou formas simbólicas de manter viva a memória do bebê. Guardar uma foto do ultrassom, escrever uma carta ou dar um nome são maneiras de ressignificar a dor e manter o vínculo afetivo.
Por: Carolina Sepúlveda
Foto: Reprodução