Caso Marielle: Em delação, Ronnie Lessa confessa homicídio de rival de ex-vereador Girão na Zona Oeste do Rio

 

Em acordo de delação premiada com a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República (PGR), Ronnie Lessa, além de confessar os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, admitiu ter cometido outros crimes. Em um dos depoimentos, o ex-policial militar relatou ter matado André Henrique da Silva Souza, conhecido como André Zóio, em 14 de junho de 2014, na comunidade Gardênia Azul, Zona Oeste do Rio.

De acordo com as investigações, Zóio era rival do ex-vereador Cristiano Girão, durante uma disputa pelo controle da favela. Na ação, a companheira de Zóio, Juliana Sales de Oliveira, também foi executada. Girão, denunciado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Milícias por supostamente chefiar uma organização criminosa no local, também foi alvo de operação da Polícia Civil pelo crime.

Em anexos aos quais O GLOBO teve acesso, Lessa detalha a migração de Zóio de Campo Grande para a Freguesia, uma área dominada por milicianos. Lessa afirmou que a presença de Zóio deixou os moradores “apavorados” e que decidiu eliminá-lo após uma discussão em um bar:
“Nesse dia, eu fui importunado pelo nacional André, falecido. Nessa época, eu tinha máquinas de música e fliperamas naquela região toda ali da Gardênia Azul, Rio das Pedras e Araticum. Esse rapaz veio de Campo Grande em uma época de guerra de milicianos e no final ficou no comando da Gardênia Azul o Zóio, um tal de Grande e um tal de Cominho. Esses três eram as lideranças conhecidas na época e ele me mandou alguns recados através de um operador.”

Lessa afirmou que Zóio passou a cobrar parte do lucro dos equipamentos eletrônicos, o que ele resistiu a pagar:
“Nesse dia que eu estava com meu filho e ele veio me importunar, ele estava numa atitude de cobrança afrontosa, com arma na mão. Ele também viu que coloquei a mão na minha arma no restaurante. Uma coisa complicada para acontecer na frente de uma criança. Não sei se ele ia atirar em mim ou se simplesmente veio para me afrontar e mostrar que também tinha uma arma. No final, ele acabou rendido e eu cheguei a tirar a arma dele. Até mandei devolver no dia seguinte. Mas isso para ele foi uma afronta danada.”

Lessa detalhou ter usado fuzis e um carro Doblô branco na ação que matou Zóio. Esse crime, junto com outros dez, faz parte de uma unificação de sentenças oferecida a Lessa, que deverá cumprir uma pena entre 20 e 30 anos, com 18 em regime fechado:
“Decidimos usar armamento pesado para enfrentar o dono da favela dentro da Gardênia Azul. Quando notamos o carro dele, ele foi morto por disparos de AK-47.”

Lessa negou ser responsável pela morte de Juliana:
“Para supostamente conferir o que não precisava ser conferido, o Fábio (Fábio da Silveira Santana, o Fábio Caveira) deu mais tiros no André, que já estava morto, e matou a menina. Isso não era o combinado. Só o André era para morrer.”

Questionado, Lessa negou conhecer Girão e afirmou que a motivação do homicídio de Zóio foi pessoal. O ex-vereador, no entanto, foi denunciado como o mandante do crime pelo Ministério Público do Rio.

Em outros anexos da delação, Lessa afirmou que a ordem para matar Marielle veio do deputado Chiquinho Brazão e seu irmão, Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Ele também acusou Rivaldo Barbosa, então chefe da Polícia Civil do Rio, de proteger os supostos mandantes.

Barbosa e os irmãos Brazão, presos preventivamente desde 24 de março, negam participação no crime.