Prefeitura do Rio corta subsídios e reduz oferta de ônibus a partir desta quarta-feira (16)

Enquanto os cariocas ainda se adaptam à obrigatoriedade do cartão Jaé para gratuidades, em vigor desde 5 de julho, e se preparam para a migração total do sistema até 2 de agosto, a Prefeitura do Rio anuncia mais uma mudança: a partir desta quarta-feira (16), o Rio de Janeiro terá uma redução significativa na oferta de ônibus fora dos horários de pico. A prefeitura decidiu cortar subsídios ao sistema, o que levará a uma diminuição de 20,1% no número de viagens diárias (de 25.952 para 20.730) e de 18,5% na quilometragem mensal rodada (de 1,1 milhão para 906.680 km), segundo dados do Fórum de Mobilidade Urbana. A medida afetará mais de 90% das 352 linhas e 26 serviços da cidade, com impactos principalmente entre 9h e 15h e após as 20h.
A secretária municipal de Transportes, Maína Celidonio, justificou a decisão afirmando que muitos ônibus circulavam “praticamente vazios” fora do horário de rush, o que caracterizava um desperdício de recursos. O corte nos subsídios deve economizar R$ 200 milhões no segundo semestre. A tarifa, no entanto, permanecerá em R$ 4,70.
A mudança foi baseada em dados do sistema de bilhetagem eletrônica Jaé (que substituirá o RiCard a partir de agosto), que permitiu à prefeitura identificar linhas com baixa demanda. “Constamos que havia ‘gorduras’ no sistema. Algumas linhas, como as que passam pela Avenida Brasil, perderam passageiros após a entrada em operação do BRT Transbrasil”, explicou Celidonio.
Embora a prefeitura garanta que manterá pelo menos um ônibus por linha durante a madrugada, passageiros já demonstram preocupação. Graziele Ramos, usuária da linha 371 (Praça Seca–Praça Tiradentes), que terá 23,9% das viagens cortadas, relatou que já enfrenta longas esperas:
“À tarde, espero 40 minutos e, de repente, chegam cinco ônibus juntos. Era melhor distribuir os horários do que simplesmente cortar”
O Sindicato das Empresas de Ônibus (RioÔnibus) afirmou que seguirá as orientações da prefeitura, mas lembrou que nos últimos anos foi instruído a aumentar a frota mesmo com demanda estável. O subsecretário Guilherme Braga Alves disse que a operação poderá ser ajustada conforme a necessidade, mantendo uma margem de 15% acima da demanda real.
A qualidade do serviço, que já era motivo de reclamações, aparece refletida no Índice de Qualidade do Transporte (IQT) do primeiro trimestre, onde nenhuma das 478 linhas avaliadas atingiu nota máxima. Enquanto a linha 448 obteve 0,95 (em escala até 1), a SP553 ficou com apenas 0,31. Os problemas vão desde alterações de rota (1.887 multas em 2024) até mau funcionamento do ar-condicionado (1.223 multas), passando por questões de acessibilidade (573 multas) e conservação dos veículos.
A situação do ar-condicionado é especialmente crítica, com a prefeitura tendo descontado R$ 3,3 milhões em subsídios por falhas no sistema. A promessa de frota 100% climatizada, feita em 2014 por Eduardo Paes, ainda não se concretizou completamente, 213 dos 3.970 ônibus licenciados em julho ainda circulam sem refrigeração adequada. Nesta quarta (16), entram em vigor novas regras de fiscalização com sensores instalados em veículos fabricados até 2019.
A transição para o Jaé, apresentada como solução para “quebrar a caixa preta” do transporte, também enfrenta obstáculos. Com postos de atendimento lotados e 142.158 cartões aguardando retirada, os passageiros se veem entre a necessidade de aderir ao novo sistema e a persistência de problemas operacionais. A integração com modais estaduais (metrô, trem e barcas) ainda não foi alcançada, obrigando muitos usuários a carregar dois cartões.
Enquanto isso, passageiros como Yasmin Fonseca, biomédica de Campo Grande, já enfrentam jornadas exaustivas, três horas diárias no trajeto para o trabalho, em ônibus com bancos soltos e ar-condicionado quebrado. Com a redução de 27% nas viagens da linha 309 que utiliza, sua situação pode piorar. Caso semelhante vive Graziele Ramos, usuária da linha 371 (que terá 23,9% menos viagens), que já espera 40 minutos à tarde por um ônibus.
Especialistas, no entanto, alertam para os riscos da medida. Licínio Machado Rogério, do Fórum de Mobilidade Urbana, critica a falta de consulta ao Conselho Municipal de Transportes e ressalta que “é preciso ter ônibus na rua independentemente do número de usuários por horário”. Marcus Quintela, da FGV Transportes, defende que ajustes desse porte deveriam esperar pela integração completa dos horários de todos os modais.
Por: Beatriz Queiroz
Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo