Avanço: Cientistas conseguem mapear estrutura e atividade cerebral de camundongos apenas com fragmento de tecido

Em um feito que parecia impossível há algumas décadas, uma equipe internacional de cientistas conseguiu mapear, com riqueza de detalhes, a estrutura e a atividade cerebral de um camundongo a partir de um fragmento de tecido do tamanho de um grão de areia. A conquista representa o maior e mais detalhado “diagrama de fiação” já feito do cérebro de um mamífero.
O projeto, que envolveu cerca de 150 cientistas de 22 instituições e levou quase uma década para ser concluído, foi liderado pelo Instituto Allen para Ciência do Cérebro (EUA), a Faculdade de Medicina Baylor e a Universidade de Princeton. Os resultados foram publicados na revista científica Nature no dia 9 de abril.
A partir de um milímetro cúbico do córtex visual de um camundongo — região do cérebro responsável pelo processamento das imagens — os pesquisadores identificaram 84 mil neurônios e cerca de 500 milhões de sinapses, revelando a complexa arquitetura de um sistema cerebral em plena atividade. Ao todo, o tecido analisado continha 5,4 quilômetros de conexões neurais.
A pesquisa faz parte do programa MICrONS (Machine Intelligence from Cortical Networks), iniciativa financiada pelo governo dos Estados Unidos para aproximar os estudos da neurociência das tecnologias de inteligência artificial.
Segundo os cientistas, a atividade cerebral foi monitorada enquanto o camundongo assistia a trechos de filmes como “Matrix” e “Mad Max: Estrada da Fúria”, além de vídeos de esportes radicais. Após o registro, o cérebro do animal foi eutanasiado, fatiado em mais de 28 mil lâminas ultrafinas e reconstruído digitalmente com o auxílio de inteligência artificial.
Para o professor Sebastian Seung, da Universidade de Princeton, o estudo marca o início de uma transformação digital na ciência do cérebro. “Com alguns cliques, agora podemos acessar informações que antes exigiriam uma tese inteira para serem obtidas”, afirmou.
O chamado conectoma — mapa das conexões cerebrais — representa apenas 1/500 do volume total do cérebro de um camundongo, mas já ocupa 1,6 petabytes de dados. A expectativa é que o estudo ajude a avançar na compreensão de doenças como Alzheimer, Parkinson, autismo e esquizofrenia, por meio da comparação entre cérebros saudáveis e cérebros com alterações.
Mapear um cérebro humano, no entanto, ainda está longe de se tornar realidade. De acordo com os pesquisadores, o cérebro humano é cerca de 1.500 vezes maior que o do camundongo, o que representa um enorme desafio técnico e ético. Mesmo assim, os cientistas afirmam que estão cada vez mais próximos de tornar possível o que antes era considerado inalcançável.
Foto: Allen Institute